minha relação paradoxal com o choro
finalmente de volta! feliz demais em conseguir escrever algo depois de tanto tempo lutando contra um bloqueio criativo imenso. pensei em excluir a conta de vez, mas cá estamos e aqui ficaremos.
Nós, seres humanos, já nascemos chorando. Cabe ao nosso corpo continuar ou engolir o pranto. Eu, por aptidão ou profecia, desde que nasci, nunca mais parei de chorar.
Lembro-me do exato momento em que percebi que era a ‘chorona’ da parada. Foi durante o primário, no momento que precisei cortar o cordão umbilical e viver algumas horas longe da minha mãe. Estava chovendo e o pátio gélido e cinza me trazia uma sensação esquisita e pulsante, tal como se eu estivesse sob a ação de algum anestésico. Carregada em um sonho perto das neblinas. As mães, todas presente com seus guarda-chuvas coloridos, se exprimiam entre as grades do pátio forçando uma despedida calorosa com os filhos. “Até mais tarde” “daqui a pouco a mãe vem te buscar” “não chora”. Não chora. Essa foi a frase -ou sentença- que eu mais ouvi durante toda minha vida. O pátio ia se esvaziando calmamente, como deve ser. As mães iam embora aos poucos, tentando disfarçar para que os filhos não notem sua ausência, exceto a minha mãe. Essa, teve que passar as grades e agachar ao chão para tentar me acalmar e cessar o choro, foram longos minutos. Durante os dois primeiros meses, era choro que não acabava mais. Sem precisar contar, as lágrimas poderiam encher um cômodo inteiro, tal qual Alice no País das Maravilhas. Eu não conseguia controlar a ardência nos olhos enquanto estava naquele lugar sem minhas muletas emocionais. O nariz ficava vermelho, a garganta dava um nó e nem preciso citar a dor no estômago que mais tarde, resultaria em uma gastrite nervosa.
Sou assim desde que me conheço por gente. Choro por qualquer coisa que me afete minimamente. Choro quando preciso fazer algo novo. Choro quando sinto que vou explodir senão chorar. Já chorei em todos os cantos e canteiros desse Rio de Janeiro. Tenho muitas anedotas sobre essas choradeiras. Com isso, minha fama de chorona foi instaurada com louvores e eu passei a ser a pessoa sentimental que, aparentemente não sabe lidar com nada sem fazer um escarcéu. Fui associada a todo tipo de coisa derivada de sensível, mas principalmente, como fraca. Ser conhecida como fraca me atormentou por anos.
Sempre que eu estava na companhia de outras pessoas, sejam adultas ou crianças, eu estava sempre preparada para ouvir que meu recurso emocional era nada mais nada menos que uma fraqueza, para piorar: uma fraqueza de mulher. Por isso, sentia uma necessidade quase inerente de mostrar o quanto eu podia ser forte. Toda vez que alguém me desafiava a ser valente, eu performava uma personalidade que nada tinha de manhosa. Até o momento em que as lágrimas caíam sem que eu conseguisse controlá-las, meu intuito era guardar o choro e só colocar pra fora quando estivesse em casa. Às vezes conseguia e sacrificava minha vontade momentânea. Toda essa emoção reprimida vivia em estado de alerta, só esperando o momento da combustão. Tudo era visceral.
Hoje, eu vejo o quanto me afetou ser a filha/sobrinha/amiga/prima “fraca” e o quão injusto é ter esse termo para si. Nada me deixa tão fragilizada quanto chorar na frente de outrem, me sinto a mesma garotinha fragilizada e consequentemente, fraca. Nunca me orgulhei dessa característica até agora. Lógico, tudo ainda é visceral. Tudo ainda é colossal. Ora, como poderia não ser? O mundo não é fácil para quem mora ao sul do Equador. Existe dor e existe pranto e existe sacrifício. Juntos, dançam um samba potente e sem pudor que enlouquece as nossas lamúrias. Somos um povo que abraça a tristeza com alegria, que dá colo pra angústia e tira ela pra dançar. Acho que desde pequena, eu já sentia essa melancolia tropical dentro de mim. De forma que, intuitivamente, sabia que depois do choro tudo melhorava e eu conseguia ver brilhinhos através dos olhos marejados. Logo o mundo se equilibrava novamente, sentia até maresia, o movimento dos barcos... Que coisa boa é poder ressignificar todas as coisas, que bom é conseguir chorar com o sorriso bonito de alguém e ver um pôr do sol cheio d’água.
Obrigada por existir aqui e por seguir escrevendo. Eu te amo.
A chorar é natural , que bom é sentir seus sentimentos e tem amor. que bom que a gente tem emoções. devemos ter a seguridade a expressar